https://www.youtube.com/watch?v=M3icM7lgixU
O que fazer diante da consciência? Hamlet
percorreu cindo atos na maior peça em tamanho de Sheaskspeare, para testar a
amizade com Marcelo. Para testar a falsa amizade com Rosecrantz. Para descobrir
que sua mãe cedeu apenas a sua sensualidade. Para descobrir que seu pai quer
vingança. E para chegar ao ponto em que tendo matado Polônio, tendo matado
Cláudio, tendo se envolvido numa trama que levará a morte sua mãe, que levou ao
suicídio de Ofélia, que matou o irmão de Ofélia, e que Le próprio acabou sendo
ferido pela espada envenenada, em que El passou por toda provação, ele está
pronto a gora a olhar as coisas com objetividade. Como a peça segue regras
retóricas, como todas as grandes
tragédias, a personagem deve se mutilar ou morrer ao final. Ou ela deve matar
ou ser morta ou se mutilar. Édipo arranca os olhos, Efigênia, Izmália, todas as
personagens trágicas, da Grécia até amor de perdição, de Camilo castelo Branco
a Sófocles atrás, todas as grandes peças nós temos que purgar, temos que chegar
à catarse, e Hamlet nos oferece um caminho um pouco distinto, não é necessário
que você mate a oito pessoas e a si, para que você atinja a sua consciência. É
necessário que pela primeira vez na vida, diz o Hamlet em longos monólogos,
você consiga dizer apenas o que as coisas são. E para isso Hamlet tem que se
fingir de louco. Me disse um psiquiatra no Rio de Janeiro, num congresso, que
quando ela era diretor da Pinel na
década de 70, todos os esquizofrênicos e outros abalados andavam pelo pátio da
pinel fazendo isso (gesto imitando falar ao celular), andando pra lá e pra cá,
falando num telefone imaginário. E ele descobriu que com a invenção do celular,
todos andam assim, e que os esquizofrênico0s apenas era visionários do que
seria nesse momento. Diz ele também que todos os com síndrome persecutória viam
câmeras os filmando de todos os lados, e hoje nós estamos sendo filmados de
todos os lados. Os loucos foram apenas faróis da raça, pessoas que intuíram o
que aconteceria. Porque como escreveu Erasmo no “elogio da loucura” às vezes é
preciso ser louco pra dizer o óbvio. Às vezes é preciso ser louco pra dizer que
todos os problemas que nos são mostrados na televisão, são problemas falsos pra
que nós não vejamos os reais, que todas as fotos que são exibidas nas revistas
são enganos de consciência pra que eu não veja o que eu não quero ver, o rosto
da Medusa. Que todas as festas são um barulho alto pra impedir que eu expresse
a melancolia densa e profunda da minha existência. E que quanto mais eu
fotografar e passar adiante e comunicar, e quanto mais eu escrever potássio, potássio,
potássio, (kkk) é maior sinal que eu estou triste, que eu estou precisando que
o mundo inteiro curta a vida que eu não estou curtindo, que o mundo inteiro me
diga como é legal a vida que eu próprio estou achando insuportável. E se muitas
pessoas me disserem isso, eu consigo evitar que o resto seja silêncio, eu
consigo evitar a solidão, eu consigo finalmente descobrir que eu vivo em
sociedade, mas que a minha consciência é minha, o meu projeto é meu, a minha
vida é absolutamente minha, que ela é resultado das minhas escolhas, que o meu
eu e imperativo, que eu estarei onde eu desejar, construirei a família que eu
desejar, a partir de uma série de reflexões, que vão interagir com o real, que
vão interagir com a decisão das outras pessoas. Escreveu, em espírito
Foucaultiano, um filósofo, que nós estabelecemos hospícios a partir do século
XIX, pra que tivéssemos certeza que os que estão lá dentro são loucos, logo por
consequência, conclusão lógica “eu não sou”. Se eu não estou no hospício, há
uma chance grande de eu não ser louco. A idade média não tinha hospícios porque
a separação entre loucos e não loucos era muito mais fluida, na idade média.
Hamlet nos diz que nós temos que estabelecer poderes, temos que estabelecer
cenas, temos que estabelecer etiquetas, formalidades porque eu não aguento
constatar que todo o mundo é um teatro e que o papel que eu estou representando
e que cada um que representa na sua vida é insuportável. Porque não é o papel
que eu escrevi, não é o papel que eu queria e não é o papel absolutamente
daquilo que eu desejava. Recebi uma revelação de um senhor que muito simples,
porteiro de um local que eu frequento, confessou que retirou todo o seu fundo
de garantia de uma vida inteira pra assistir, não vou identificar o time, que
ele seguia e que jogaria no Japão na final do mundial de clubes. Ao narrar
isso, todas as pessoas que ouviram a história ficaram horrorizadas. Como é que
uma pessoa tira o produto de uma vida do banco e vai vero time num país
distante? Numa viajem caríssima que o Japão? E eu pensei “é provável que seja a
única coisa que ele fez, absolutamente notável, épica e dele. E todas as
outras, guardar dinheiro, comprar casa, financiar, entrar num programa
habitacional e trabalhar todos os dias sejam o palco do qual ele foi ensinado
pela família, por Deus, pela religião, a funcionar”. Na insanidade desse
porteiro, ele pela primeira vez foi alguém, e quando ele tiver netos talvez ele
diga a única coisa que ele fez a vida interia “vovô tirou todo o dinheiro e foi
ver o time ser campeão em Tóquio”. Os netos não saberão como ele não sabe bem
onde fica Tóquio, mas aquele ato extremo, ousado, terrivelmente épico, foi a
grande insanidade lógica que deu luz e sentido à vida dele. Hamlet está
dizendo, quando todo mundo é normal, racional, equilibrado, poupa, tem plano de
saúde, se veste equilibradamente, combina bege com marrom, azul marinho com
azul celeste, usa sapato preto fechado, quando as mulheres vão pra entrevista
com colar de pérolas e tailler, e os homens vão de terno escuro e gravata
bordeaux, quando todos dizem que querem contribuir para a empresa, e querem dar
tudo de si em nível de pessoa enquanto gente, para que essa empresa cresça,
quando todos publicam que são felizes, quando todos dizem sem cessar “esta é
minha vida e minha vida é legal” porque “eu estou viajando”, porque “eu estou
comendo esse prato” vejam, quando todos dizem a mesma coisa eu preciso dizer
que "Ser louco é a única possibilidade de ser sadio nesse mundo
doente".
sexta-feira, 30 de outubro de 2015
Assinar:
Postagens (Atom)